14-agosto-2016 - 20º Domingo do Tempo Comum Lc 12,49-53
A Palavra de Deus que hoje nos é servida nos convida a
tomar consciência da radicalidade e da exigência da missão que Deus nos confia.
Não há meios-termos: Deus nos convida a
um compromisso, corajoso e coerente, com a construção do “novo céu” e da “nova
terra”. É essa a nossa missão profética. A primeira leitura nos apresenta a
figura do profeta Jeremias. O profeta recebe de Deus uma missão que vai lhe trazer
o ódio dos chefes e a desconfiança do Povo de Jerusalém: anunciar o fim do
reino de Judá. Jeremias vai cumprir a missão que Deus lhe confiou, doa a quem
doer. Ele sabe que a missão profética não é um concurso de popularidade, mas um
testemunhar, com verdade e coerência, os projetos de Deus. O Evangelho reflete
sobre a missão de Jesus e as suas implicações. Define a missão de Jesus como um
“lançar fogo à terra”, a fim de que desapareçam o egoísmo, a escravidão, o
pecado e nasça o mundo novo – o “Reino”. A proposta de Jesus trará, no entanto,
divisão, pois é uma proposta exigente e radical, que provocará a oposição de
muitos; mas mesmo assim, Jesus aceita enfrentar a morte, para que se realize o
plano do Pai e o mundo novo se torne uma realidade palpável. A segunda leitura nos
convida a correr de forma decidida ao
encontro da vida plena – como os atletas que não olham a esforços para chegar à
meta e alcançar a vitória. Cristo – que nunca cedeu ao mais fácil ou ao mais
agradável, mas enfrentou a morte para realizar o projeto do Pai – deve ser o
modelo que o cristão tem à frente e que orienta a sua caminhada.
Reflexão:
¨ O Evangelho mostra que o objetivo de Jesus não passava
por conservar intacto o que já existia, pactuando com essa paz podre que não
questiona o mal, a injustiça, a escravidão; mas o objetivo de Jesus passava por
“incendiar o mundo”, destruindo tudo aquilo que escraviza o homem e o priva de
vida. Como é que eu me situo face a tudo aquilo que põe em causa o projeto de
Deus para o mundo? Como é que eu me situo face a tudo aquilo que cria opressão,
injustiça, medo e morte? Com o conformismo e a indiferença de quem, acima de
tudo, não quer se chatear com coisas que não lhe dizem diretamente respeito, ou
com a coragem e o empenho de quem se sente profeta e enviado de Deus construindo o novo céu e a nova terra?
¨ O “fogo” que Jesus veio atear – fogo purificador e
transformador – já atingiu o meu coração e já transformou a minha vida? Animado
pelo Espírito de Jesus ressuscitado, eu já renunciei, de verdade, à vida de
egoísmo, de fechamento em mim próprio, de comodismo, para fazer da minha vida
um compromisso com o “Reino”, se necessário até a doação da vida?
¨ A proposta de Jesus não passa pela manutenção de uma
paz podre, que não questiona nem incomoda ninguém, mas por opções radicais, que
interpelam e que obrigam a decisões arriscadas. No entanto, a Igreja de Jesus
aceita muitas vezes abençoar as ideologias que escravizam e oprimem, para
manter uma certa paz social (a paz dos cemitérios?), para “defender a
civilização cristã” (como se pudessem ser cristãos aqueles que constroem
máquinas de injustiça e de morte) ou para manter determinados privilégios.
Quando isto acontece (e tem acontecido muitas vezes, ao longo da história), a
Igreja estará sendo fiel a esse Jesus,
que veio lançar o fogo à terra e que não veio trazer a paz, mas a divisão?
Jesus era um apaixonado por Deus, seu Pai, e dos homens,
seus irmãos. Como qualquer apaixonado, vem abrasar os que estão à sua volta com
o fogo da sua paixão: as suas palavras aquecem, os seus gestos queimam, o seu
projeto de mundo novo destrói o mundo antigo. Então, Ele gostaria tudo se
iluminasse, que tudo se abrasasse, que tudo aquecesse. Porém, Ele encontra o
tédio; alguns gostariam de apagar este fogo mesmo antes de ser acendido. O batismo
de que fala é a sua Passagem, a sua Páscoa, este momento em que dará a maior
prova do seu amor. Alguns gostariam de impedi-lo de falar ou de agir, mas Ele
prosseguirá o seu caminho, este caminho que o levará ao calvário. Então,
compreendemos quanto lhe custa esperar para dizer e manifestar até onde pode ir
o Amor de Deus pela humanidade…
Como é estranho este Jesus, cuja missão consiste em fazer
a paz e em reconciliar os homens com Deus e entre eles, este Jesus que dirá aos
seus apóstolos “deixo-vos a paz, dou-vos a minha paz” e que, aparecendo aos
seus discípulos na tarde de Páscoa, dir-lhes-á: “Paz para todos”. E eis que
hoje Ele declara: “Pensais que Eu vim estabelecer a paz na terra? Não. Eu vos
digo que vim trazer a divisão”. Reconheçamos, primeiro, que Jesus não pensava
necessariamente segundo a lógica cartesiana. A sua mentalidade semítica
ignorava certas “nuances”, não tinha receio daquilo que nós chamamos de contradições.
Na realidade, tal maneira de falar nos obriga a ultrapassar as aparentes
contradições, a encontrar o “ponto nodal” do nosso pensamento. Segundo os
homens, a paz pode ser um equilíbrio do medo, ou uma ordem que o mais forte
impõe ao mais fraco (“pax romana”, imposta pelas armas romanas), ou ainda a paz
dos cemitérios. Ela pode ser também a obra da justiça e esta paz já é bem mais
difícil de realizar. Quando fala de paz, Jesus afirma que não é a paz como a
compreendemos muitas vezes. A sua paz, não a dá como o mundo a dá. Ultrapassa
os critérios humanos. A sua paz é, a realidade, o fruto do amor, mas de um amor
desconcertante pelas suas exigências: “amai os vossos inimigos”. O amor que
Jesus veio nos revelar e dar é o amor do Pai. Na medida em
que aceitamos ir até aí, podemos entrever a paz segundo Jesus. Dizendo de outro
modo, diante de Jesus, é preciso escolher: ou acolher o seu amor que faz saltar
todas as nossas limitações, ou fecharmo-nos em nós mesmos pelo egoísmo ou pela
indiferença. Na realidade, Jesus vem pôr a olho nu o nosso coração. Escolher
por ou contra Jesus: inevitavelmente, surgirão conflitos. O fogo que Jesus traz
à terra é o fogo do amor que desmascara as nossas recusas e, ao mesmo tempo, as
purifica.
Meditação para a semana. . .
Deus, meu libertador. Com a confiança do salmista,
podemos pedir esta semana a Deus para nos ajudar a libertar de tudo aquilo que
entrava a nossa liberdade, tudo aquilo que nos impede de ser simplesmente
felizes ao longo dos dias… A oração do Salmo 39, retomada todos os dias, pode
ser um meio…
fonte:
www.dehonianos.org.br
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