15 Junho 2017 - SOLENIDADE DO SANTÍSSIMO CORPO E SANGUE
DE CRISTO
Na festa de Corpus Christi, a Igreja revive o mistério da
Quinta-Feira Santa à luz da Ressurreição. Também a Quinta-Feira Santa conhece
uma sua procissão eucarística, com a qual a Igreja repete o êxodo de Jesus do
Cenáculo para o monte das Oliveiras. Em Israel, celebrava-se a noite de Páscoa
em casa, na intimidade da família. Fazia-se assim memória da primeira Páscoa,
no Egito da noite em que o sangue do cordeiro pascal, aspergido na arquitrave e
nos portais das casas, protegia contra o exterminador. Jesus, naquela noite,
sai e entrega-se ao traidor, ao exterminador e, precisamente assim, vence a
noite, vence as trevas do mal. Só desta forma, o dom da Eucaristia, instituída
no Cenáculo, encontra o seu cumprimento: Jesus entrega realmente o seu corpo e
o seu sangue. Atravessando o limiar da morte, torna-se pão vivo, verdadeiro
maná, alimento inexaurível para todos os séculos. A carne torna-se pão de vida.
Na procissão da Quinta-Feira Santa, a Igreja acompanha Jesus ao monte das
Oliveiras: a Igreja orante sente um desejo profundo de vigiar com Jesus, de não
o deixar sozinho na noite do mundo, na noite da traição, na noite da
indiferença de muitos. Na festa de Corpus Christi, retomamos esta procissão,
mas na alegria da Ressurreição. O Senhor ressuscitou e nos precedeu. Nas
narrações da Ressurreição há uma característica comum e fundamental; os anjos
dizem: o Senhor “vai à vossa frente para a Galiléia. Lá o vereis” (Mt 28, 7).
Considerando isto mais de perto, podemos dizer que este “preceder” de Jesus
exige uma dupla direção. A primeira é como ouvimos a Galileia. Em Israel, a
Galileia era considerada como a porta que se abre para o mundo dos pagãos.
E na realidade precisamente na Galileia, no monte, os discípulos veem Jesus, o
Senhor, que lhes diz: “Ide… fazei discípulos de todos os povos” (Mt 28, 19). A
outra direção do preceder, por parte do Ressuscitado, aparece no Evangelho de
São João, nas palavras de Jesus a Madalena: “Não me detenhas, pois ainda não
subi para o Pai…” (Jo 20, 17). Jesus nos precede junto do Pai, eleva-se à
altura de Deus e nos convida a segui-lo. Estas duas direções do caminho do
Ressuscitado não se contradizem, mas indicam ao mesmo tempo o caminho do
seguimento de Cristo. A verdadeira meta do nosso caminho é a comunhão com Deus
o próprio Deus é a casa com muitas moradas (cf. Jo 14, 2s.). Mas só podemos
subir a esta morada indo “em direção à Galileia” indo pelos caminhos do mundo,
levando o Evangelho a todas as nações, levando o dom do seu amor aos homens de
todos os tempos. Por isso o caminho dos apóstolos prolongou-se até aos “confins
da terra” (cf. Act 1, 6s.); assim São Pedro e São Paulo foram até Roma, cidade
que na época era o centro do mundo conhecido, verdadeira “caput mundi”.
A procissão da Quinta-Feira Santa acompanhou Jesus na sua solidão, rumo à “via
crucis”. A procissão de Corpus Christi, ao contrário, responde de maneira
simbólica ao mandamento do Ressuscitado: nos precede na Galileia. Ide até aos
confins do mundo, levai o Evangelho a todas as nações. Sem dúvida, para a fé, a
Eucaristia é um mistério de intimidade. O Senhor instituiu o Sacramento no
Cenáculo, circundado pela sua nova família, pelos doze apóstolos, prefiguração
e antecipação da Igreja de todos os tempos. Por isso, na liturgia da Igreja
antiga, a distribuição da sagrada comunhão era introduzida com as palavras: Sancta sanctis o dom sagrado destina-se
aos que são tornados santos. Deste modo, respondia-se à admoestação dirigida
por São Paulo aos Coríntios: “Portanto, examine-se cada um a si próprio e só
então coma deste pão e beba deste vinho…” (1 Cor 11, 28). Contudo, desta
intimidade, que é dom muito pessoal do Senhor, a força do sacramento da
Eucaristia vai além das paredes das nossas Igrejas. Neste Sacramento, o Senhor
está sempre a caminho no mundo. Este aspeto universal da presença eucarística
sobressai na procissão da nossa festa. Nós levamos Cristo, presente na figura
do pão, pelas estradas da nossa cidade. Nós confiamos estas estradas, estas
casas a nossa vida quotidiana à sua bondade. Que as nossas estradas sejam de
Jesus! Que as nossas casas sejam para Ele e com Ele! A nossa vida de todos os
dias estejam penetradas da sua presença. Com este gesto, colocamos sob o seu
olhar os sofrimentos dos doentes, a solidão dos jovens e dos idosos, as
tentações, os receios toda a nossa vida. A procissão pretende ser uma bênção
grande e pública para a nossa cidade: Cristo é, em pessoa, a bênção divina para
o mundo, que o raio da sua bênção
abranja todos nós!
Na procissão de Corpus Christi, acompanhamos o Ressuscitado no seu caminho pelo
mundo inteiro como dissemos. E, precisamente fazendo isto, respondemos também
ao seu mandamento: “Tomai e comei… Bebei todos” (Mt 26, 26s.). Não se pode
“comer” o Ressuscitado, presente na figura do pão, como um simples bocado de
pão. Comer este pão é comunicar, é entrar em comunhão com a pessoa do Senhor
vivo. Esta comunhão, este ato de “comer”, é realmente um encontro entre duas
pessoas, é deixar-se penetrar pela vida d’Aquele que é o Senhor, d’Aquele que é
o meu Criador e Redentor. A finalidade desta comunhão, deste comer, é a
assimilação da minha vida à sua, a minha transformação e conformação com Aquele
que é Amor vivo. Por isso, esta comunhão exige a adoração, requer a vontade de
seguir Cristo, de seguir Aquele que nos precede. Por isso, a adoração e a
procissão fazem parte de um único gesto de comunhão; respondem ao seu
mandamento: “Tomai e comei”.
Bento XVI - 2005
fonte:
www.dehonianos.org
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